Por Luiz Holanda*
.....Os parlamentares acusados de corrupção são, hoje, maioria no
Congresso Nacional. A par disso, possuem garantias jamais concedidas ao
brasileiro comum, pois além de receberem um salário bem acima da média nacional,
só podem ser julgados - no caso de pratica de crimes comuns-, pelo Supremo
Tribunal Federal-STF, instância máxima do nosso Poder Judiciário. Se levarmos em
conta o ritmo dos julgamentos dessa alta corte, os acusados - depois do
mensalão-, poderão até ser condenados, mas jamais serão punidos, seja pelo
excesso de recursos protelatórios, seja pelo fato de serem atingidos pela
prescrição. Segundo informações do próprio tribunal, nos últimos 10 anos foram
concluídas vinte ações criminais envolvendo parlamentares. Dessas, a metade foi
enviada para a primeira instância. A outra caiu no esquecimento. Entre as que
chegaram a um desfecho, em 13 houve prescrição; nas demais, ninguém foi
punido.
.....O levantamento não considerou os inquéritos instalados contra
parlamentares na própria corte, cuja soma chega à casa dos milhares. Somente
nessa legislatura 189 parlamentares estão sob investigação, o que significa um
volume jamais visto nos parlamentos do mundo. Estimativa dominante no próprio
tribunal confirma que a decisão de abrir ou não um processo criminal contra
parlamentares leva praticamente um ano. Para os especialistas em nossa mais alta
corte, esta não tem vocação para punir ninguém, principalmente os garantidos
pelas chamadas imunidades, que, no dizer do ex-ministro Carlos Veloso, é
sinônimo de impunidade. Segundo ele, nunca um parlamentar foi punido em toda
história do STF.
.....Naturalmente que houve alguma mudança, haja vista a decisão
dessa corte de acabar com o foro privilegiado para ex-autoridades. Mesmo assim,
a impunidade continuou. Veja-se, por exemplo, o processo contra a ex-ministra da
Fazenda Zélia Cardoso de Mello. Acusada de envolvimento no esquema de corrupção
montado pelo empresário Paulo César Farias, a ex-ministra de Collor entre 1990 a
1992 foi indiciada pelo Ministério Público Federal por receber dinheiro do
esquema PC para aumentar tarifas de ônibus. Quatorze anos depois, o processo
ainda corre na justiça, sem nenhuma perspectiva de desfecho. Começou no STF,
onde ficou por cinco anos; depois foi para a Justiça Federal, onde dorme em
berço esplêndido.
.....O processo do mensalão também serviu para demonstrar uma
evidência escancarada de infiltração de interesses partidários no julgamento
dessa corte. Os ministros Toffoli e Lewandowski são a maior prova disso. Como se
sabe, ao presidente da República cabe indicar o ministro para o Supremo,
enquanto o Senado, por maioria absoluta, pode ou não referendá-la, após uma
ligeira conversa tida como “sabatina”. Isso significa que se o chefe do
Executivo escolher um esbirro partidário qualquer e os senadores - agindo como
meros despachantes-, aprovar a escolha, o novo ministro será apenas um serviçal
de quem o indicou, com a responsabilidade de pagar a indicação com favores
jurídicos, decidindo sempre a favor da impunidade.
.....No caso de Toffoli e Lewandowski eles próprios acentuaram o
problema pela falta de comedimento em suas lucubrações jurídicas, desprezando os
fatos e sem a compostura que o cargo que ocupam requer. Em uma delas,
Lewandowski, enveredando pela Antiguidade Clássica, atribuiu a Fidas uma frase
dita por Apeles. Não satisfeito, maltratou Ortega e Gasset transformando-o num
mero naturalista. Na ânsia de tentar diminuir a pena dos companheiros, atacou
seus colegas de corte de forma até grosseira, embora o “data vênia” protocolar
que aplica não signifique outra coisa senão extrapolar –sempre com a mão no
queixo-, a verbosidade jurídica de quem não tem nada a dizer. Mas o fato é que,
com o julgamento do mensalão, parece haver uma transformação no STF, a
evidenciar que a corte mudou, e que, a partir de agora, o dano não será, como
dizia Camões, maior do que o perigo. Vamos esperar para ver.
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*Luiz Holanda é professor de Ética e de Direito Constitucional
da Faculdade de Direito da Universidade Católica do Salvador-UCSAL.
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