Você lembra de Queima? Perguntava um velho amigo, em uma dessas gostosas conversas de porta de bodega.
Como poderia esquecer tão ilustre e destacada figura da cena local?
Seguiam os anos oitenta em uma São José de Mipibu em que ainda não imperava a droga e onde jovens se reuniam a qualquer hora para boas conversas sem a ameaça da criminalidade.
Era comum reunirem-se amigos e ver o tempo passar, assim como as gentes.
E foi em um desses momentos de descontração que conheci Queima. Uma figura de baixa estatura, pança arqueada e o sorriso estampado de quem está sempre pronto a conquistar um novo cliente. A figura não seria Queima se não trouxesse consigo a sua "máquina fotográfica" pendurada no pescoço e um alforge carregado de "retratos" de clientes que muitas vezes simplesmente desapareciam, segundo ele próprio reclamava. Retratos, posto que era o termo que Queima usava para definir suas fotografias.
Antes, e para evitar perguntas, nunca soube o verdadeiro nome de Queima e o seu apelido surgiu em São José de Mipibu, quando um cliente, esperando para "bater a fotografia" e pela demora entre o apertar o dedo e o estalo da "maquina", simplesmente gritou "queima" e pronto. Alguém que passava ali perto ouviu o "queima" e espalhou pela cidade inteira. Assim, o nosso protagonista nunca mais foi chamado pelo seu nome de registro.
Pois bem, amigo e amiga leitores. Queima chega em São José de Mipibu em um antigo fusquinha, bem "arrumadinho", o que ele fazia questão de destacar.
Com o passar dos tempos e o sumiços daqueles ditos clientes que mandavam "queimar" e não pagavam, Queima teve que se desafazer de seu amado fusquinha e passou a trabalhar queimando seus retratos em uma pequena motocicleta, o que fez por um bom tempo.
Passado algum tempo, encontro Queima já em uma bicicleta e lhe pergunto:
- Queima, o que houve? Onde está a motocicleta?
Ele responde:
- Meu filho, eu tinha doze anos quando minha mãe me mandou comprar pão e eu fui embora. Até hoje ela espera esse pacote de pão. Eu cheguei aqui em um fusquinha. No prejuízo, com esse povo que não me paga, eu passei para a moto e agora para a bicicleta. Eu não aguento mais e vou embora antes que fique de pé!
E, assim, vi Queima seguir viagem para nunca mais voltar.
Queima!!!!!!!!!!!!!
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