sábado, 5 de outubro de 2013

Gravidade dos problemas ambientais e a inconsciência generalizada.

............Somos gratos a Washinton Novaes por toda semana em O Estado de São Paulo nos brindar Vamos ter que esperar por racionamentos?
com dados e reflexões atualizadas sobre o estado da Terra, da vida e da Humanidade. Ajuda a superar a geral inconsciência da maioria da população mas especialmente de nossos governantes, na linguagem de Fritjof Capra verdadeiros “analfabetos ecológico”. Estamos rumando na direção de um abismo e eles continuam a discutir taxas de juros, inflação, metas como se tivéssemos todo o tempo futuro à sua disposição. Não se preocupam com o principal que é o pressuposto de todos os demais problemas. Publicamos aqui seu artigo que apareceu em O Estado de São Paulo no dia de São Francisco, 4/10/2013 sob o título:

Lboff

 É cada vez mais freqüente na sociedade a sensação de que as instituições das áreas de políticas públicas  (Executivo, Legislativo; no Judiciário os problemas têm outros formatos)  parecem  sempre mais distantes da formulação de macropolíticas e projetos capazes de resolver nossos gravíssimos problemas sociais. Suas decisões ou são muito limitadas na abrangência ou atendem a interesses específicos dos formuladores e dos que os apóiam – não da sociedade nem da solução de graves carências que a afligem. 
     Ainda há poucos dias (28/9), este jornal publicou em várias páginas as gravíssimas conseqüências das alterações no clima do planeta enumeradas no novo relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, da ONU) e endossadas pela quase totalidade dos cientistas. Que conseqüências ou desdobramentos isso está tendo em nossas políticas internas ? Que urgência está sendo dada às recomendações do IPCC, embora seu secretário-geral, Rajendra Pachauri, tenha dito que o mundo está “a cinco minutos da meia noite”?
         Não que nos faltem, internamente, informações capazes de embasar políticas adequadas. Ainda há poucas semanas, o próprio relatório de 345 cientistas do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas – onde o governo federal está representado – afirmou que a temperatura no nosso Semiárido (que já passa pela maior seca em 50 anos)  poderá aumentar de 3 a 4,5 graus Celsius até o fim do século, com a 40 a 50% menos de chuvas; na Amazônia poderão ser 6 graus mais; na Mata Atlântica do Sudeste poderá haver 30% mais de chuvas, no Cerrado 40% menos. Vamos mudar algo? Estudo de grupo interdisciplinar de 26 pesquisadores da Unicamp alerta (1/10) que, ao contrário, a expansão da cana-de-açúcar no Centro-Oeste, em função de vantagens econômicas de curto prazo, esconde problemas sociais e ambientais que “tendem a se agravar por causa de mudanças climáticas”. A necessidade de irrigação intensa, principalmente, está levando a conflitos pelo uso de recursos hídricos cada vez mais escassos – quando o conveniente seria gerar variedades mais resistentes às condições locais. Enquanto isso, as administrações públicas “parecem fascinadas demais pela riqueza fácil” trazida pela cultura. 
         Nessa área dos recursos hídricos, não é preciso trazer de novo os dramas do saneamento, com quase 90 milhões de pessoas no país sem ligação de suas casas com redes de esgotos, quase 15 milhões sem receber água tratada – e com todas as nossas bacias hidrográficas, da Bahia ao Sul,  em “situação crítica”, segundo a Agência Nacional de Águas, por causa do despejo de esgotos sem tratamento. 
         Mas não é só aqui. Na recente 23.a Semana Mundial da Água, em Estocolmo, lembrou-se (2/9) que as insuficiências no abastecimento de água provocam 5 mil mortes diárias no mundo, quase 2 milhões por ano. 350 cientistas reunidos no seminário “Water in the Anthropocene”, em Bonn, asseguraram (New Scientist, 1/6) que “em apenas uma ou duas gerações a maioria da população da Terra sofrerá com a falta de água de boa qualidade”.Mais de metade dos rios e córregos dos Estados Unidos, diz a Agência de Proteção Ambiental daquele país (16/4), já tem problemas graves  de contaminação dos peixes, contaminação por bactérias fecais e nutrientes contidos em fertilizantes, que fazem proliferar algas, poluem com fósforo e nitratos. A cada ano, diz o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA que 100 milhões de toneladas de nitrogênio usadas nas lavouras chegam aos oceanos. O respeitado Thomas Friedman (The New York Times) contou neste jornal (STADO, 10/5) que ao visitar o Iêmen encontrou uma cidade na região de montanhas  (Taiz) onde as pessoas  só podem usar as torneiras de suas casas por 36 horas a cada 30 dias; no restante do tempo, têm de pagar por água transportada por caminhões que a comercializam. 
         A gravidade progressiva dos conflitos por água já está à vista. O volume de água necessário para produzir energia dobrará no mundo em 15 anos, segundo a Agência Internacional de Energia (O Globo, 31/3). Enquanto isso, já chegamos à perda de 50% das áreas úmidas no planeta, com o avanço da exploração agropecuária, industrial e urbana. E ainda precisaríamos aumentar o consumo de água para irrigação, de 70% do total atual para 90%, com o aumento da população. Como ? No Forum Mundial da Água, em junho, em Foz do Iguaçu, o brasileiro Benedito Braga, seu presidente, enfatizou que o Nordeste brasileiro “já precisa armazenar água”. E foi ao ponto central abordado no início deste texto:   “Soluções técnicas nós temos; mas a questão é política; e necessita de recursos financeiros.”  
         Enquanto não chegamos às macropolíticas e à conjugação de projetos, vamos com ações isoladas. São Paulo lança pacote de barragens e diques urbanos, mas continuamos com centenas de milhares de pessoas morando em áreas de preservação obrigatória às margens de reservatórios para abastecimento. Enquanto se vai buscar mais água a dezenas de quilômetros de distância e a custos altíssimos; outras tantas pessoas vivem em áreas de risco, sujeitas a deslizamentos, desmoronamentos. Não se consegue evitar que dezenas de afluentes do Tietê, sepultados sob o asfalto, levem para o rio mais lixo e sedimentos; e ele tem mais de 100 quilômetros de suas águas sob um mar de espuma, que o transforma no rio mais poluido do país, embora a nascente, em Salesópolis, continue a fornecer água potável (ESTADO, 22/9). 

         Onde teremos de chegar? Todos os dias discutimos o crescimento ou recuo do produto interno bruto, o avanço ou decréscimo da dívida pública, o progresso ou retrocesso deste ou daquele setor econômico, mais ou menos empregos – mas sem discutir o que está na base física de tudo: os recursos naturais (que não são infinitos). Será preciso enfrentarmos racionamentos, penúrias ?  Não teremos competência para formular políticas adequadas?
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