Desde os protestos de
junho passado e as manifestações que se seguiram, desde os episódios de
violência que ocorreram em meio a
algumas delas - restritos a um número
mínimo de participantes -, vem se difundindo através de alguns órgãos da
mídia e através do discurso de algumas autoridades a ideia de que a solução é
o aumento da repressão. Desde o final do ano passado, discutem-se projetos de
lei que permitam tipificar certas ações de protesto como "terrorismo",
de modo a poder prender e condenar manifestantes que se "excedam".
A preocupação em garantir um clima pacífico para os jogos (e os negócios)
da Copa do Mundo é o pano de fundo para estas tentativas.
Para quem viveu
na ditadura, ou para quem conhece um pouco da história do nosso país, parece
que estão querendo ressuscitar a "Lei de Segurança Nacional". Estão querendo
criminalizar o protesto. Estão querendo caracterizar manifestações como risco
para a segurança dos/as cidadãos/ãs. Um dos elementos fundamentais da
democracia é o direito à liberdade de expressão, de opinião, de manifestação.
Um ambiente social pacífico não pode ser conquistado às custas deste
direito.
Os/As cidadãos/ãs devem poder expressar suas reivindicações ou
suas discordâncias, sem receio de que seu ato seja considerado um crime.
E o Estado deve garantir as condições para que este direito seja exercido,
assim como deve garantir segurança para a população e, portanto, impedir atos
de violência. Isto deve ser feito na forma da lei e de maneira a não colocar
em risco a vida das pessoas. O primeiro exemplo de respeito aos direitos deve
vir do Estado, das forças de segurança. Do mesmo modo, o protesto por parte
dos/as cidadãos/ãs deve ser pacífico - como foi até agora por parte de 99%
dos/as manifestantes -, e a violência deve ser coibida.
O mundo não se
tornou mais seguro depois do desencadeamento da "guerra ao terror" pelo
governo Bush. Ao contrário, vários direitos civis foram violados e a
liberdade das pessoas foi cerceada. A legislação nos Estados Unidos e em
vários outros países se tornou mais repressiva, gerando um clima de tensão e
de medo que muitos têm denunciado: entramos num caminho em direção a Estados
"de exceção", a sociedades de controle - câmeras por toda parte, dados
pessoais devassados, invasão de privacidade (de correio eletrônico,
inclusive), policiamento ostensivo. Contrariamente à intenção divulgada,
não ficamos mais seguros, estamos sob o olhar e a vigilância permanente
do "Grande Irmão".
Não queremos isso aqui: lutamos muito para
redemocratizar este país. Construímos uma Constituição Cidadã (1988) e o que
desejamos é aprofundar a democracia conquistada para que ela seja
efetivamente expressão da soberania popular, e falta um bom caminho para
isso. Não queremos voltar atrás.
Os recentes acontecimentos, que
resultaram numa tragédia lamentável - a morte do cinegrafista Santiago Ilídio
Andrade -, não podem servir de pretexto para promover uma mudança em nossa
legislação que a torne mais autoritária. A solução para a violência é mais
democracia e não menos.
Também não podem servir para lançar uma "caça
às bruxas" com acusações infundadas lançadas irresponsavelmente através de
meios de comunicação. Nós temos exemplos suficientes em nossa história
dos desastres que tais iniciativas podem produzir: acusações que,
depois de acabar com a reputação de cidadãos/ãs, se evidenciam
falsas.
E, procurando ir ao âmago da questão: por que tais manifestações?
Por que tais protestos? Qual a resposta que as autoridades deram às
"vozes das ruas"? Para dar um único exemplo, as planilhas de custos dos
meios de transporte público foram abertas, tornadas públicas,
para justificar os aumentos que foram (e estão sendo
novamente) solicitados?
Antes de criminalizar manifestantes, que se
procure responder às reivindicações dos/as cidadãos/ãs, que se abram canais
de diálogo entre representantes e representados/as. E que se faça uma
profunda reforma do nosso sistema político, para permitir que o povo
seja realmente o soberano desta nação.
Direção Executiva
da Abong
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