Os números constantes de
levantamento feito pela Polícia Federal (PF) sobre as suas investigações de
desvios de recursos e corrupção em prefeituras de todo o País são
impressionantes. Embora se refiram a inquéritos ainda em curso, eles dão uma
ideia da amplitude das suspeitas - baseadas em indícios fortes o suficiente para
mobilizar a Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado (Dicor), da
PF - que pairam sobre um setor da maior importância da administração pública, o
dos governos municipais. São 3.167 inquéritos que envolvem 484 prefeitos e
ex-prefeitos, suspeitos de violarem dispositivos do Decreto Lei 201/67. Estão
também sendo investigados 182 servidores, 87 secretários municipais e 63
funcionários que ocupam cargos em comissão.
Aquele decreto lei caracteriza
os ilícitos cometidos por prefeitos e vereadores e prevê 23 casos capazes de
provocar sérios danos ao erário. Por exemplo, apropriação de bens ou rendas
públicas, desvios de recursos em benefício próprio ou alheio, deixar de prestar
contas anualmente, efetuar despesas não autorizadas por lei e fraudes em
licitações. As penas para esses delitos vão de 2 a 12 anos de
prisão.
O Maranhão concentra o maior
número de inquéritos (644), seguido pela Bahia (490), Ceará (296), Piauí (285),
Pará (196) e Pernambuco (194). Isto se explica, segundo o delegado Oslain Campos
de Santana, chefe do Dicor, pelo fato de esses Estados, serem mais carentes e
por isso receberem mais recursos da União, o que aumenta as oportunidades de
fraudes. "São elevadíssimos os recursos que a União repassa para os municípios,
principalmente através de convênios na áreas de educação e saúde", lembra ele.
Em São Paulo e Rio foram abertos, respectivamente, 96 e 83
inquéritos.
Tanto para ter uma ideia mais
precisa da situação quanto para que as investigações possam produzir resultados
concretos - isto é, fornecer ao Ministério Público e à Justiça os elementos
necessários para eventuais denúncias e punições -, é preciso aguardar a
conclusão dos inquéritos. O que, se for seguido à risca a legislação que regula
a matéria - o que infelizmente nem sempre é o caso -, deve acontecer em breve.
Os inquéritos policiais devem ser concluídos no prazo de 30 dias. Podem ser
renovados por mais 30 dias pela Justiça, desde que por motivo relevante,
devidamente exposto pela autoridade policial.
Em entrevista ao Estado, o
delegado Oslain Santana mostra como agem as organizações criminosas em relação
ao poder público e o perigo representado por cada uma delas. Elas se distribuem
por três grupos. Um, de matriz mafiosa, se infiltra no aparelho do Estado e
investe mais em corrupção de agentes públicos do que em atos de violência para
realizar seus "negócios" e ampliar cada vez mais seu poder. "Veja o exemplo do
Carlinhos Cachoeira. Começou com jogo do bicho e foi se infiltrando no
Estado."
Numa outra categoria estão o que
a PF chama de "grupos agressivos", que apelam para ações armadas, como ocorre no
Rio e em São Paulo. Eles são violentos, mas têm poder econômico reduzido, se
comparado com o dos outros grupos, e sua infiltração no aparelho estatal não é
profunda.
O grupo que mais preocupa a PF,
pelo seu poder e seu raio de atuação, é formado, segundo Oslain Santana, pelas
"organizações de colarinho-branco ou das elites, pessoas acima de qualquer
suspeita, mas que movimentam grandes esquemas". Por isso, são as mais
perniciosas do ponto de vista da PF. "Desviam bilhões dos cofres públicos para
benefício pessoal. Tiram dinheiro da educação e da saúde por meio de violações
constantes do Decreto Lei 201/67 e da Lei de Licitações." Deixando de lado a
confusão de criminosos de colarinho-branco com as "elites" - citadas de forma
vaga, imprecisa -, um conceito que ele claramente não domina, o delegado Santana
tem razão para chamar a atenção para a capacidade que esse último grupo tem de
causar graves prejuízos aos cofres públicos, em vista de seu poder de
aliciamento e corrupção. É de esperar, portanto, que continue a merecer cuidado
especial da PF.
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