Fernando ‘Baiano’ Soares, apontado como um dos operadores de propinas
na Petrobrás ligado ao PMDB, descreveu aos investigadores da Operação
Lava Jato, em sua delação premiada, como acertou com o presidente da
Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), estratégias para pressionar o
lobista Julio Gerin Camargo a pagar US$ 16 milhões em propinas
atrasadas, relativas a contratos de construção de navios-sonda da
Petrobrás. Segundo Baiano, foram reuniões na casa e no escritório do
presidente da Câmara, no Rio, ocorridas entre 2010, na época de campanha
eleitoral, e 2011.
“Entrando pela portaria principal do condomínio, virando à esquerda,
acredita que seja a quarta casa da rua, sendo uma casa amarela, com
alguns detalhes em branco”, disse Fernando Baiano, ao descrever aos
procuradores e delegados da Lava Jato um dos primeiros encontros que
teve com o peemedebista na residência do parlamentar. “Na Barra da
Tijuca, no Condomínio Park Palace.”
Neste endereço, Fernando Baiano diz
que foi selado o acordo entre ele e Eduardo Cunha para o uso de
requerimentos oficiais da Câmara dos Deputados como forma de pressionar o
lobista Julio Camargo a pagar a propina atrasada.
O dinheiro era referente à contratação de um dos dois navios-sonda
(Petrobras 10000 e Vitoria 10000) da Samsung Heavey Industries, da
Coreia, em parceria com o Grupo Mitsui, do Japão. Os negócios fechados
entre 2006 e 2007, pela Diretoria de Internacional da Petrobrás – cota
do PMDB no esquema de fatiamento político da estatal, que inclui ainda
PT e PP – envolveram US$ 35 milhões em propina. Desse valor, US$ 5
milhões teriam ido para as contas secretas de Eduardo Cunha, na Suíça,
ou disponibilizados em recursos, doações a uma igreja e horas de voo em
um jato.
“É uma casa de dois andares, sendo uma casa aparentemente espaçosa”,
contou Fernando Baiano, buscando na memória detalhes dos encontros que
teve com o presidente da Câmara. “Na casa de Eduardo Cunha, ao adentrar,
o escritório onde se reunia com ele (Fernando Baiano) ficava na
primeira porta do lado esquerdo, razão pela qual não teve muito contato
com o restante da residência.”
As declarações de Baiano foram prestadas no dia 10 de setembro de
2015, à Procuradoria Geral da República, nos inquéritos que correm no
Supremo Tribunal Federal (STF). Parte delas, como esse termo de número
3, foram também anexados aos autos da Lava Jato, em Curitiba – onde
estão processos que envolvem alvos sem foro privilegiado.
Eleições. A primeira reunião descrita pelo lobista
na residência de Cunha teria ocorrido no segundo semestre de 2010,
quando o presidente da Câmara era um dos candidatos a deputado federal
pelo PMDB do Rio. “Nesta reunião o depoente (Fernando Baiano) explicou a
Eduardo Cunha que tinha feito duas reuniões com Julio Camargo, assim
como alguns contatos telefônicos, mas que Julio ainda estava buscando
ganhar tempo, ’empurrando com a barriga'”, registra a força-tarefa da
Lava Jato, no termo de delação número 3 do lobista do PMDB.
O lobista relatou que “como estava no auge da campanha eleitoral,
Eduardo Cunha disse que naquele momento não tinha como gastar tempo com
aquilo, mas que iria pensar em algo e voltaria a falar” com Baiano
‘oportunamente’.
Pós-eleição. O desfecho da história, que tem
interesse crucial para os investigadores da Lava Jato, teria ocorrido no
primeiro semestre de 2011. “Só voltou a falar com Eduardo Cunha após as
eleições, oportunidade em que esteve no escritório dele para
parabeniza-lo pela reeleição”, conta Fernando Baiano.
Uma nova reunião na casa do presidente da Câmara, no Rio, veio a
acontecer em março de 2011, diz o delator. “Nesta reunião, o depoente
(Fernando Baiano) perguntou se não poderia ser retomado o assunto de
Julio Camargo e o que Eduardo Cunha poderia fazer algo”, registrou o
delator. Ele propôs então que a cota de 20% da dívida de propina que
seria dada para Cunha seria elevada para 50%, em contrapartida a uma
“pressão mais forte, como uma reunião em que ele estivesse presente ou
outra coisa do tipo”.
Seriam US$ 16 milhões, sendo que parte disso já comprometida com a
corrupção de agentes públicos da Petrobrás, como Nestor Cerveró e Eduado
Musa – delator da Lava Jato. “Eduardo Cunha disse que iria pensar em
alguma forma mais efetiva de cobrar Júlio Camargo, pois se fizesse uma
reunião com ele, pressionasse e não tivesse resultado, ficaria ruim”,
explicou Fernando Baiano.
Solução parlamentar. O lobista atribui ao presidente
da Câmara a saída encontrada por eles para pressionar com efetividade o
representantes das multinacionais que construíram os dois navios
sondas, usando a ex-deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), como autora do
pedido.
“Tempo depois, por volta de abril de 2011, Eduardo Cunha mandou uma
mensagem, pedindo para o depoente se encontrar com ele no escritório do
Rio de Janeiro de Eduardo Cunha”, registra a Procuradoria.
“Nesta reunião Eduardo Cunha disse que havia tomado a decisão de
fazer um requerimento na Comissão de Fiscalização da Câmara pedindo
explicação sobre os negócios de Julio Camargo.”
Pistas. Os investigadores da força-tarefa da Lava
Jato têm elementos suficientes para apontar o envolvimento de Cunha no
esquema de corrupção na estatal. O relato do lobista Fernando Baiano,
que está preso desde dezembro de 2014, em Curitiba – sede das
investigações – traz elementos, como os registros do condomínio, sobre
esses supostos encontros narrados na delação.
“Há uma câmera logo que se chega, apontada para dentro do veículo”,
afirmou Fernando Baiano. “Após anotar a placa, se questiona qual seria o
destino e então era feita uma ligação pelo funcionário da guarita para a
casa de Eduardo Cunha, pedindo autorização para entrar”, explica o
delator aos investigadores, que buscam pistas de registro dos encontros.
O presidente da Câmara negou repetidas vezes o recebimento de
propinas no esquema Petrobrás. O PMDB tem reiterado que jamais autorizou
qualquer pessoa a agir em nome do partido.
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Fonte: Estadão
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