(Chico Alencar - Deputado Federal, PSOL/RJ)
A proposta do Código Florestal apresentada pelo
deputado Paulo Piau (PMDB/MG) é decepante e decepcionante. Decepcionante porque
Sua Excelência sempre proclamou “isenção” e “olhar técnico” sobre o projeto que
veio do Senado. Ele não procedeu assim: atuou, nas modificações propostas, de
acordo com os interesses do agronegócio. Aqui não se trata de um Código
Florestal, mas de um Código facilitador das grandes atividades econômicas no
campo brasileiro. O enfoque produtivista, sem mediação com a urgente e
necessária preservação ambiental, predominou. A fantástica biodiversidade e os
ricos biomas brasileiros, já tão maltratados, continuarão vulneráveis.
Relembramos que o Código Florestal em vigor, desde
1965, agora sepultado, nunca foi respeitado integralmente. Isto explica nossos
recordes de desmatamento, enchentes destruidoras, estiagens recorrentes,
espécies em extinção. Tudo soma negativamente para os extremos climáticos que
afetam o planeta como um todo. E atinge nossa lisonjeira posição de país que tem
a maior reserva de água doce do mundo.
Das 21 propostas de alteração feitas pelo relator,
apenas duas procedem, por retirarem repetições do texto que veio do Senado. As
demais são desastrosas: rejeitam princípios como a “importância da
biodiversidade”, o “compromisso com a sustentabilidade”, a “proteção da
vegetação nativa” e a “integração da norma florestal com as demais políticas
ambientais”. Tudo isso foi simplesmente retirado do artigo 1º, para evitar
“dubiedade na Justiça”, segundo o relator!
A proposta, que obteve apoio da maioria do
plenário da Câmara, é FRAGILIZADORA: das nascentes, dos cursos d´água, dos rios,
das matas ciliares, dos manguezais, dos nossos biomas. Deixa indeterminada a
recuperação da vegetação nativa nas Áreas de Proteção Permanente. Exclui a
delimitação de faixa de proteção das veredas. Não exige APPs em reservatórios de
água de até um hectare. Dispensa também APPs em imóveis de até 15 módulos
voltados para a aquicultura. Rejeita a determinação de que municípios delimitem
faixas de passagem de inundação por meio dos planos diretores e leis de uso do
solo. Recusa a exigência de implantação e manutenção de áreas verdes de 20
metros quadrados por habitante nas novas expansões urbanas. Retira controles
sobre a atividade madeireira, inclusive a emissão de documento de origem
florestal. Exclui a obrigatoriedade da oitiva do órgão ambiental federal para
supressão de vegetação que abrigue flora ou fauna ameaçada de extinção. Favorece
créditos e incentivos a ruralistas, sem exigências de programa de regularização
ambiental no prazo de 5 anos, anistiando e premiando a quem desmatou
irregularmente. Joga fora a destinação de 30% dos recursos arrecadados com
cobrança pelo uso da água (Lei 9.433/97) para manutenção, recomposição ou
recuperação de Áreas de Preservação Permanente em bacias hidrográficas. Abre
novas possibilidades de empreendimentos da carcinicultura e outras atividades
econômicas nos biomas costeiros. Transfere para legislação posterior, inclusive
de âmbito estadual, a obrigatoriedade da recomposição das matas
ciliares.
Tudo isso poderá soar, sem dúvida, como um
‘liberou geral’ para os que exploram economicamente o campo
brasileiro.
Por tudo isso, quando a consciência cidadã
planetária se empenha no princípio do CUIDADO e da PRECAUÇÃO, e o mundo sofre
com a devastação do produtivismo sem critérios, só podemos repudiar essas
alterações no Código Florestal Brasileiro. O PSOL, como da votação inicial aqui
na Câmara, e como praticado no Senado Federal, por nossa representação, afirma
que todo esse processo está equivocado: não buscou informações junto à ciência,
manipulou os pequenos da agricultura camponesa e extrativista como biombo para
os interesses dos grandes, agiu no interesse imediato, descomprometido com as
futuras gerações e o Bem Viver na Terra.
Sobre a decisão que o Parlamento tomou, cabe
alertar: o futuro nos cobrará, a História não nos absolverá.
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