sábado, 19 de julho de 2014

SEQUESTRO DAS CRIANÇAS DO PLANALTO EM NATAL: CRIMES DE GUERRA IMPUNES EM TEMPOS DE PAZ!


Há uma tragédia velada e dolorosa que atinge lares brasileiros, sobretudo, em comunidades humildes das periferias das nossas cidades: OS DESAPARECIMENTOS DE PESSOAS, assunto em boa hora resgatado pela Campanha da Fraternidade de 2014.

Estima-se que cerca de 250.000 pessoas desapareçam por ano no Brasil. Em torno de 40.000, seriam crianças, arrancadas dos seus pais criminosamente para fins de exploração sexual, no trabalho ou macabramente para transplante de órgãos, dentre outras formas de proscrição da convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes no Brasil.

O Brasil ainda nem se aproximou do esclarecimento dos Desaparecimentos Políticos ocorridos no Regime Militar e já tem essa outra dívida cívica para com a nação: OS DESAPARECIDOS em Tempos de Paz, para resgatarmos a expressão utilizada por Bosco Brasil em sua peça, adaptada magistralmente para o cinema por Daniel Filho, com exuberantes interpretações de Toni Ramos e esse extraordinário Dan Stulbach que emociona e trás a esperança para a vida novamente nos monólogos do aludido filme.

Crianças desapareceram em Natal também na década de 90. No bairro Planalto, Zona Oeste, entre Novembro de 1998 e Abril de 2001. 5 crianças foram sequestradas dos seus lares humildes e até os dias que correm suas famílias nunca mais tiveram qualquer notícia dos seus paradeiros como pode se depreender da relação dos casos a seguir:

29/Novembro/1998
Moisés Alves da Silva, com 1 ano e 7 meses, desaparece de casa.
09/Fevereiro/1999
Joziana Pereira dos Santos, com oito anos, sumiu da casa de uma vizinha identificada como Sandra Aparecida.
04/Janeiro/2000
Yuri Ribeiro Cardoso, de 2 anos e 3 meses foi levado da rede.
10/Abril/2000
Gilson Enedino da Silva, então com um ano foi levado
21/Dezembro/2001
Marília Gomes da Silva, com dois anos, desaparece.

É a última criança do bairro a ser levada. 

Além desses “desaparecimentos”, a crônica do saudoso Diário de Natal, em 7 de Julho de 1996, resgata um outro caso também acontecido no Planalto, o de Daiane Pereira da Silva. Há ainda a indicação de um outro sequestro realizado na favela do DETRAN e que teria como vítima uma criança nominada Joana D’arc.

Além da cobrança da Imprensa e da Comunidade dos Direitos Humanos das Crianças e Adolescentes, houve outras iniciativas tentando trazer luz ao caso como a passagem na nossa capital da CPI das Crianças Desaparecidas que fez audiência em Natal a 04/12/2009 por iniciativa das Deputadas Federais Sandra Rosado e Fátima Bezerra e que contou também com a participação das Deputadas Lílian Sá (RJ) e Emília Fernandes (RS), dentre outros.

Posteriormente, já a 3 de dezembro de 2012, recebemos em Natal, a CPI do Tráfico de Pessoas, por iniciativa dos Senadores Paulo Davin, Vanessa Graziotin(AM) e Lídice da Mata (BA) que cobraram a federalização das investigações, mas que concorreram de forma efetiva para que fosse nomeado para o caso, o Dr. Ben Hur de Medeiros, da Delegacia de Capturas da Civil que, assumindo a presidência dos trabalhos e contando com apoio que faltou em outros anos, conseguiu nesta manhã divulgar o primeiro retrato com a projeção de envelhecimento de Joziana Pereira dos Santos e descortinar linhas de investigações ainda em segredo de justiça que podem lograr a vir a esclarecer esse episódio doloroso de forma continuada para a sociedade potiguar no geral e particularmente para os pais “órfãos” de filhos vivos. De registro também o engajamento dos dos demais policiais civis da DECAP e dos Promotores de Justiça , Dr. Thibério Fernandes , devotado e firme na busca de luzes e do Dr. Jovino Pereira da Costa Sobrinho, espécie de Guardião da Linha do Tempo do caso.

Por demais comovente a participação em todos os momentos dos familiares das crianças, mesmo em meio à pobreza, amargura e desamparo.

Num mundo marcado pelo egoísmo e frenética luta por bens materiais, emociona vê-los ter como principal combustível das suas vidas a tenaz caminhada em busca do paradeiro das suas crianças, hoje, já adolescentes e a JOVEM JOZIANA, habitantes sabe-se lá de que terras, coabitando sabe-se lá com quem. Fazendo o que? aonde? , com quem?

Desconhecedores da suas origens, da sua história. Pontas de um sofrimento desestruturante da vida dos seus pais. Quem sabe vetores da felicidade de “outros pais egoístas” e do sucesso mercadológico dos cruéis mercadores de vidas.

Sueli, Francisca, Djalma, Severino, Geraldo e Lindalva continuam presentes e caminhando por sobre as dores e equilibrando-se em tênues esperanças. Mesmo lacrimejando os olhos, sofrendo. Mas respirando e insistindo na busca. Essa resiliência também pode ser chamada por esperança!

José Augusto, recentemente e Marcileide , no mês de Julho de 2010, já se foram, sem poder olhar nos olhos dos seus filhos e de novo reabraçá-los como num congresso de afetos tardios e sequestrados.

As notícias dessa semana, primeiro, com a coleta de material para exames de DNA na Polícia Federal que tão bem nos acolheu através do DPF Moura e peritos e, hoje, com a divulgação da foto com a projeção do envelhecimento de JOZIANA, podem parecer pouco ou quase nada para quem observa os fatos de longe. Para quem acompanha o caso na medida do possível, como eu, todavia, são filamentos de luzes egressas de vagalumes num breu de impunidade e desalento. Incapazes de iluminar, porém intermitentes, anunciando que a esperança precisa ser cultivada e fortalecida ainda que com réstias de possibilidades.

Sim , o Caso das Crianças Seqüestradas do Planalto, Zona Oeste de Natal, Rio Grande do Norte permanece um mistério e uma dor escancarada. Um diploma também da insuficiência do trabalho das nossas instituições provedoras do necessário acesso à Justiça para uma cidadania plena.

A divulgação da foto de JOZIANA e a coleta de DNA dos familiares de GILSON, MARÍLIA, MOISÉS e YURI, todavia, mostra que mesmo distando mais de uma década e meia, ainda é possível haver o esforço e fazer a esperança renascer pela crença de que o sonho louco de justiça ainda pode ser materializado na terra de Poti com um trabalho integrado entre o órgãos que paulatinamente irá fazendo a verdade aflorar, assemelhando-se mesmo a lição Drummondiana D’A flor e a náusea: 

"Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
É feia. Mas é flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio".

Ainda há uma imensidão de coisas a serem feitas. Mas ao menos a ESPERANÇA começou a ser cuidada no caso das Crianças Sequestradas do Planalto. E a Esperança surpreende pela teimosia e pela RESILIÊNCIA.

Quarta-feira lá na Polícia Federal e hoje na DEGEPOL, Dona Lindalva, mãe de Joziana, vítima de Crimes de Guerra em Tempos de Paz, me disse mais uma vez : EU TENHO ESPERANÇAS!
Não trás a eloqüência de Dan Stubach no filme, mas trás uma carga dramática indescritivelmente convincente.

Já passou da hora de acharmos as crianças do planalto!

JOZIANA, ONDE VOCÊ ESTÁ?

Marcos Dionísio Medeiros Caldas
Presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos (2012-2014) e Ex-presidente do Conselho Estadual da Criança e do Adolescente (2009-2010)
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A FOTOGRAFIA ABAIXO MOSTRA COMO JOZIANA, UMA DAS VÍTIMAS, PODE ESTAR HOJE.
SE VOCÊ VIU ESTA PESSOA ENTRE EM CONTATO (84 - 3273-3980)



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