segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Eu tenho vergonha de (ter votado em) Dilma

Votei na Dilma em 2010; em 2014 não. Assim como votei no Lula em 2002, mas não em 2006. Portanto, não coloco a questão em termos de “petismo” e “antipetismo”. 

Não tenho a menor dúvida de que o governo Lula trouxe enormes conquistas psicossociais. Só não o ajudei a se reeleger porque meu feeling era de que a corrupção estava rolando solta, e com a conivência dos altos escalões
Nunca esqueci minha inquietação quando a responsabilidade de José Dirceu no caso de corrupção de seu assessor, Waldomiro Diniz, ainda em 2003, no início do governo, foi varrida pra baixo do tapete. Eu me perguntava o porquê do próprio Dirceu não ser demitido. Eu não sabia de nada, inocente.
Quando votei em Dilma, na primeira eleição dela, achava que no embate eleitoral em 2010 com Marina ela teria se qualificado. Teria entendido que não era oba oba (“mãe do PAC”, essas bobagens de marqueteiro) mas a continuidade do processo, com alguma necessária depuração. Achava que a ideia de uma “mãe severa” não era de todo maluca; que o arquétipo do tiozão benévolo, ajuntador e complacente do Lula estava mesmo precisando de um contraponto moralizador.
O que até pareceu funcionar no início do governo dela, quando ministros caiam como moscas, por corrupção, sem que ninguém estivesse fazendo nenhum grande esforço em derrubá-los (foram sete ministros saindo do governo em menos de um ano, sendo que um só deles, Nelson Jobim, por questões políticas “normais” – esse saiu atirando em Dilma). Se o PT tivesse encarado o processo do mensalão não como uma ofensa, mas como a oportunidade de purga, de mandar um monte de pilantra para o chuveiro, o partido estaria hoje em outra situação (como eu escrevi aqui, há quase um ano, em Joaquim Barbosa, benfeitor do PT, mas o PT não notou).
Conto tudo isso porque, com toda a vergonha que senti de Dilma e por Dilma, de lá pra cá (tentei fazer um balanço aqui, no texto Dilma está errando porque não tem como acertar), um limite acaba de ser ultrapassado. É quando a presidente surge depois de praticamente dois meses de silêncio e o melhor que tem a dizer é que Fernando Henrique não investigou a corrupção na Petrobrás em… 1996 ou 1997, no século passado.
Ora bolas. Uma parte considerável dos eleitores simplesmente não se lembra bem do governo Fernando Henrique, ou porque era uma muito jovem, ou porque está muito velho, ou porque não tem essa curiosidade e memória política toda. Portanto, petistas virem esgrimir argumentos como o de que o governo FHC foi o mais impopular da história das pesquisas não significa simplesmente nada. Para quem tem memória, curiosidade e conhecimento político, o governo FHC não foi nem de longe o pior, nem sequer da história recente (que inclui Collor e Sarney). E, de resto: a) deu as bases do que seria a política ecômica no governo Lula; b) foi sucedido pelo PT exatamente para que os aspectos perversos do processo psicossocial continuassem a ser depurados.
Essa fala olímpica (“olímpica” aí é um eufemismo para “totalmente descabida”) de Dilma não é a de uma ministra de Lula, a de sua sucessora na presidência, e a de presidente do conselho de administração da Petrobrás quando o ato isolado mais suspeito da história da empresa, a compra da refinaria de Pasadena, foi concretizado, como o ex-presidente Fernando Henrique foi praticamente obrigado a lembrar.
A coisa é tão sem-noção que FHC pode ser quase elegante na nota que publicou, dizendo quando muito que Dilma “deveria em vez de tentar encobrir suas responsabilidades jogando-as em mim (…), fazer um exame de consciência e assumir que pelo menos foi descuidada e (…) aguardar com mais serenidade”. FHC, comprador descarado de votos para a emenda da reeleição, e comandante das privatizações suspeitas, está ficando bem na fita (vide o meme que ilustra esta postagem).
O problema é que, ao longo de seu governo, Dilma não só adquiriu uma “flexibilidade” petista para com a picaretagem, como ao mesmo tempo continua querendo posar de salvadora e moralista – sem ter nem a habilidade de jogo nem o “corpo fechado político” que Lula já teve. Para se agarrar ao poder, Dilma está conseguindo fazer uma síntese do pior de dois mundos, a covardia conivente por um lado, e o moralismo cocoroca de comadre de bairro por outro. Não que o país não continue precisando de uma moralizada – mas de verdade.
Em política, a habilidade requerida é fazer costuras sempre, por um lado, e de promover rapidamente rupturas quando são absolutamente necessárias, por outro. É exatamente o contrário do que o governo Dilma está fazendo. Essa infantilidade de “jogar a culpa no outro” é uma sequência lógica de ter adiado o máximo possível a demissão de Graça Foster, de ter inspirado o conselho da Petrobrás a publicar um balanço sem incluir os números (qualquer número) das perdas com corrupção, ou seja, de adiar o inadiável, de sustentar uma fantasia de poder que já está em frangalhos.
Não nos enganemos, monstruosidades como o novo presidente da câmara, Eduardo Cunha, são um produto direto da gestão do PT – e não de toda a sociedade. Quem consegue extrair, “genialmente”, o pior do PMDB (e o pior do PMDB é bastante ruim) é essa presidente isolada, não só de quase todas as forças políticas, mas também de um mínimo de bom senso e habilidade (o pobre Temer e o pobre Lula não sabem o que fazer). E agora, ao que parece, isolada também da realidade. Eu não tenho vergonha de ter votado em Dilma porque ela é corrupta (nem sei se é). Eu tenho vergonha de ter votado em Dilma porque ela é nada, e preside coisa nenhuma. Mais do que um impeachment, ela talvez precise de um diagnóstico.
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Fonte: https://br.noticias.yahoo.com/blogs/alex-antunes/eu-tenho-vergonha-de-ter-votado-em-dilma-225200767.html

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